Fui
assistir Cinderela (Kenneth Branagh)
com nenhuma expectativa. No pior dos casos seria mais um filme de digital
instagram esbranquiçado, que nem fede , nem cheira. E ele é, exatamente assim:
Mais do mesmo, final batido, vilã interpretada por atriz boa que rouba a cena
(Cate Blanchett). Incomoda-me ver personagens demonstrando algum interesse
amoroso quando nos últimos 30 minutos inexistem qualquer coisa que me leve a
crer em interesse físico por parte deles. Mas como a narração do próprio diz: “Basta crer em um pouco de magia” e como naqueles momentos em que algum
personagem de Woody Allen se depara
com uma epifania, eu tive algo similar com o filme.
Em
muitas maneiras, Cinderela é um melodrama clássico,
típico de Douglas Sirk: Temática contundente com seu tempo, emoções a flor da
pele e certo senso de trágico em sua narrativa. Diferentemente de Caminhos da Floresta (Crítica: http://bit.ly/1Lo1oEk ) as inúmeras afetações de seus personagens – Indo do uso
exaustivo de expressões como “How Lovely”/ “Oh, Dear”, até ao constante esforço
em tornar seus mocinhos caricaturas bondosas – não existem para esconder um humanismo interior, ou um desejo de libertação, mas sim para estabelecer um tabuleiro
e o papel de suas peças. Amor é política nesse universo movido pela ganancia por status
social elevado e pela riqueza alheia. Cinderela (Lily James) e seu Príncipe
(Richard Madden) fazem contraponto a essa situação, são idealistas que creem no
amor como força pura. O filme se
desenvolve através do choque dessas peças.
Em
minha visão acredito que essa relação idílica entre os protagonistas é bem
menos interessante do que a politicagem por detrás da impossibilidade da
realização amorosa. Reafirmo, é tudo um jogo. Branagh repudia as atitudes de seus antagonistas, mas procura
entender seus motivos, ignorando o maniqueísmo simplista da maioria dos vilões
hollywoodianos. As provações, colocadas pelo roteiro, existem justamente para
expor o ambiente corrompido em que o jovem casal se encontra. Onde o amor não
deve ser concretizado sem atrapalhar o aspecto financeiro e social em jogo. É
notável a importância conferida às relações entre seus personagens. Não existe
uma peça mal encaixada, todos possuem tempo em cena o bastante para “vestirem”
seus arquétipos, fazendo com que a fator dramático aflore. A naturalidade com
que a história flui se da devido a isso mais a relação câmera-espaço: Ambientes ressaltam a
mesquinhez dos antagonistas ou a opressão sofrida por Cinderela.
“No
Love is Free”, diz a madrasta má interpretada com bom humor por Cate Blanchett.
Um questionamento pertinente que move a obra, porém cuja resposta vem no
tradicional happy ending, com direito a narração “Acredite e tenha coragem em
mudar”. Meu criticismo inicial revelou ferramentas estéticas válidas, mas com
isso vieram outras problematizações: O jogo de interesses é superado pelo
idealismo de seus protagonistas, que é igual ao da própria Hollywood, raso e
apelativo para o grande público. O tabuleiro com as peças ganha o jogo fácil,
ao invés de tentar uma abordagem diferenciada para uma experiência, digamos,
mais satisfatória. Acaba-se por ser raso em seu discurso (Coisa que Douglas
Sirk nunca foi), mas Cinderela não
deixou de ser um filme interessante devido a suas falhas, acertos e
especialmente, pelo estranhamento causado.
Link IMDB: http://imdb.to/1CrRJcq