sexta-feira, 10 de julho de 2015

Cobain e Cidades de Papel: Imagens dos Ícones.


Semanas atrás assisti ao documentário Cobain: Montage of Heck (Brett Morgen, 2015). Filme sobre o antigo líder do Nirvana, indo de sua infância até os últimos dias que antecederam seu suicídio. Composto por entrevistas com várias pessoas próximas ao músico, animações para narrar momentos importantes de sua vida e muito material caseiro com imagens de Cobain (liberados exclusivamente para a produção desse filme). Aclamado em Sundance, o documentário está sendo constantemente avaliado como o melhor filme sobre o músico: “O documentário de rock mais intimista”, como aponta a quote da Rolling Stone ou “O documentário definitivo sobre Cobain, não a mais lugar para ir além” como apontou a Consequence of Sound. Dentre elogios tão calorosos, o filme comprova que a figura de Cobain como ídolo cultural não só se mantém intacta como permanece altamente lucrativa. Tendo o apoio da família do músico na produção, Morgen faz um documentário expositivo e sentimental absorvendo o legado de Cobain e focado em descobrir a verdade acerca da história de vida do ex líder do Nirvana. Nesse interesse em descobrir os fatos por detrás do mito, o filme cai na armadilha em martirizar ainda mais a pessoa que outrora foi chamada de “A voz de sua geração” pela cultura midiática.
Montage of Heck é mais outro documentário que mergulha seu objeto de estudo em meio a própria banalização e lugar comum que consiste seu personagem. Consequentemente o próprio filme termina banal. O interesse por seu protagonista existe apenas para enfatizar sua condição popular de ídolo das massas, inexiste Cobain para além do que é esperado de um documentário que esbanja suas imagens caseiras de “Kurt vai ao banheiro” ou “Kurt assopra as velinhas de seu segundo aniversário”. Imagens que só se tornaram públicas através desse filme, por isso ele não resiste em mostra-las várias vezes no intuito de vender tais cenas como a imagem mais próxima do real que se tem do músico. Porém não há muito a ser ver para além do mostrado. No final é Kurt Cobain tomando banho e fazendo a barba, sua intimidade se justifica apenas como desejo por parte do filme em abusar ao máximo de seu objeto e fazer hype em torno disso.

A superficialidade da obra reflete na sua esquizofrenia em martirizar um personagem que o próprio já considera como um mártir. Afinal, Cobain é/foi “A voz de uma geração”, há interesse em sua persona, pois ela ainda pode ser utilizada como parte da sociedade do espetáculo como produto a ser vendido em diversas mídias. Ironicamente, essa fome por ícones acabou agravando a depressão de Cobain. Lamentável que seu protagonista continue a ser refém de sua própria imagem midiática (algo que sempre o incomodou).

Minha relação com Montage of Heck acaba por assimilar minhas opiniões sobre o hype consequente de suas críticas. Ambos trabalham para o consumo de Kurt Cobain como mártir, existe certa agressividade na maneira como ele é apresentado. O artista existe apenas como condição secundaria, seu mito é muito maior e envolvem diversas outras ramificações. Músicas como Smells Like Teen Spirit parecem pequenas perto do impacto do “Kurt Cobain: Voz de uma geração” e é nessa condição de mito que o filme parece se apoiar, bem como as resenhas que apontei. Acaba por ser um produto mais interessante de ser refletido através da apropriação cultural da figura do músico - e o que isso representa em 2015- do que um filme válido.

“É uma cidade de papel, com pessoas de papel” frase que ecoa por todos os cantos de Cidades de Papel (Jake Schreier). Na adaptação do best seller de John Green - autor de A Culpa Das Estrelastal frase reflete não somente a ideologia do filme como também a própria forma como o filme é feito. Diferentemente de Montage, a figura do mártir – voz da geração- não se concentra em um individuo externo ou real, mas nós próprios personagens – em suas emoções e culturas individuais. A força motriz do filme consiste em carregar de subtexto seus diálogos - no intuito de localizar os personagens numa narrativa bastante contemporânea . Ao fazer isso, percebo a mesma vontade de torná-los tão icônicos e significantes como Kurt Cobain é,  para Montage of Heck.

A transformação do ícone pop midiático em seus próprios consumidores gera a mesma banalização presente em Montage. Repetindo formulas e padrões, Cidades de Papel se assemelha ao filme de Cobain em sua exposição e desespero para significar o tempo presente como importante – o primeiro pelo legado do músico e o segundo por retratar sentimentos tipicamente joviais. Há certa urgência (primariamente financeira) na temática da adaptação de Green, mas também existe a carência de uma estética forte e atraente.

Há tantos fatores (slow motion, música pop, narração em off) pra o espectador sentir toda a carga emocional do roteiro que o filme se perde na própria seriedade. Pretensioso, seria o termo apropriado. Cidades de Papel quer dizer demais; sobre seus personagens, sobre o que os rodeia. A pretensão em criar o painel de uma geração e seu (in) conformismo social. Obviamente não há nada de errado em aspirar artisticamente a representar uma cultura específica, porém sinto que esse caso está mais para vender personagens em prol de um público faminto por representação. É o casamento entre hype e o público que aflige o documentário sobre Cobain, e ele se repete aqui. Incomoda-me a generalização de sua história, obra incapaz de ser mais provocador em seu discurso, especialmente numa época em que comédias adolescentes invadem aos montes o cinema hollywoodiano.

Os protagonistas são muito caros a Cidades de Papel, ele os domina e os mantém controlados durante toda a narrativa. Uma precisão cirúrgica se da na maneira como tais personagens agem e pensam em cena, algo meticulosamente pensando para não causar estranhamento ou antipatia, é carente de atenção e desesperado por compaixão. Marketing para atrair aos interessados em ver jovens na tela. Enfatizado novamente que meu problema não se relaciona ao anseio de ser algo popular à contemporaneidade, e sim ao cinema estéril e de estética retrógrada.

Meu desejo de unir ambos os filmes em uma só critica se deu pelas várias ligações que fiz à maneira de como os filmes retratam seus objetos de estudo. Evidentemente foi um texto onde divaguei sobre suas ideologias e anseios, por isso não podia separá-los da mesma inquietação que tenho acerca da retratação de ícones modernos no cinema comercial. A frente do interesse em retratar Kurt Cobain sob um viés particular ou em retratar adolescentes à beira da maturidade existe o interesse financeiro em lucrar em cima de suas individualidades, gerando a banalidade dos mesmos. O hype acaba por proteger ambos os filmes, afinal Montage of Heck é sobre uma figura adorada pelas massas e Cidades de Papel um filme sobre jovens. O cinema sem cineasta se torna apenas um dos mecanismos utilizados para o reforço ou criação de ícones modernos alienados e alienantes.

Trailer de Montage of Heck (Com as referências das críticas que citei).

Link IMDB: http://www.imdb.com/title/tt3622592/?ref_=rvi_tt
                     http://www.imdb.com/title/tt4229236/?ref_=rvi_tt
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sexta-feira, 3 de julho de 2015

O Exterminador do Futuro: Gênesis.


Não é segredo que Hollywood prioriza o apelo cultural popular de símbolos como principal fator para desenvolver seus projetos. Antes de qualquer escolha estética (que possa vir a ser interessante ou medíocre), existe a expectativa do retorno financeiro por parte do público que conhece tal símbolo e até pelo público que não é familiarizado. O símbolo do personagem/universo/história se torna apenas uma isca, uma mentira que tais particularidades da obra são de fato singulares, quando na verdade essas estão dissipadas em meio a lugares comuns enfadonhos. Filmes de super heróis ou remakes de antigos sucessos são parte de uma equação onde o resultado é, quase, sempre retorno financeiro garantido. Existe o hype por consumir tais produtos com tamanha ferocidade devido a seu apelo – estendido a outas mídias como jogos, séries de TV, livros, etc - globalizante. Arnold Schwarzenegger como exterminador robô que profere frases de efeito se torna uma imagem publicitária e não cinematográfica. Emília Clarke está lá não como Sarah Connor e sim como Daenerys Targaryen de Game Of Thrones. O Exterminador do Futuro: Gênesis (Alan Taylor) é esquizofrênico em sua estética “Para os fãs da série e para novos expectadores”. E nem me refiro exclusivamente à “Sarah Targaryen”, mas também como o filme lida com sua diegese. Skynet, T-1000, John Connor, dentre vários outros símbolos da série que atingiu seu auge nos dois primeiros filmes de James Cameron, se perdem em meio a um plot apressado em exonerar seus elementos singulares em prol de várias viradas de roteiro. Nada surge como algo esteticamente interessante ou de valor para a narrativa. Diferentemente de Jurassic World, o novo Exterminador é tão estéril que inexiste a consciência de sua própria materialidade e diferentemente de Mad Max: Estrada da Fúria, suas cenas de ação não possuem peso dramático ou são executadas com maestria. Tudo se desfaz nesse filme, estética gritada e entregue de bandeja para quem não consegue viver sem um filme da franquia ou para quem está passando de bobeira na frente do cinema e decide ver mais um filme de ação.

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